Onde está a luz neste Natal?
No Natal, é comum haver um aumento nos pedidos de apoio psicoterapêutico. Esta época pode ser difícil para muitas pessoas, não necessariamente má, nem sempre especial ou feliz, mas frequentemente marcada por sentimentos ambivalentes que nos levam a pensar e sentir de formas contraditórias.
Por um lado, o Natal pode nos transportar para lembranças de tempos passados, onde tudo parecia perfeito. Contudo, esse sentimento de nostalgia nem sempre é fácil de lidar, especialmente quando surge em contraste com a impossibilidade de vivenciar o Natal de hoje da mesma forma, com as pessoas de agora. Lembro-me de um casal em que um dos membros me dizia que esta época era estranha para ele. Sentia saudades do Natal na casa dos avós, quando toda a família se reunia, como se algo muito importante tivesse desaparecido. A emoção era difícil de descrever, por ser algo tão profundo que não tinha um nome claro. Ao perguntar-lhe o que ele sentia que poderia tornar o Natal atual melhor, ele teve muita dificuldade em responder, o que deixou o seu companheiro muito irritado e triste, sentindo que todo o esforço que fazia para criar novas tradições e proporcionar um bom Natal não era reconhecido.
Em outra situação, um jovem paciente falava com saudade do Natal da sua infância, quando a família estava unida. Agora, ele enfrentava dificuldades que não conseguia expressar completamente, sem perceber que o que sentia falta era da unidade familiar que existia antes do divórcio dos seus pais.
Outras vezes, o Natal torna-se mais doloroso pela ausência de alguém querido, e o luto, muitas vezes, torna-se ainda mais intenso durante esta época, fazendo com que a saudade nos ocupe por completo, sem espaço para mais sentimentos.
Diante disso, como podemos tentar focar e facilitar o nosso bem-estar neste momento? Pessoalmente, gosto de recorrer a algumas ideias e simbolismos que o Advento nos oferece, como forma de reflexão e conexão com o nosso mundo interior, possibilitando mudanças positivas. Quando trabalhei na Associação Lavoisier, que promovia a prevenção da saúde mental na comunidade, pude observar como a desconstrução simbólica, não religiosa, de algumas práticas do Advento gerava um impacto significativo no desenvolvimento interno e no sentido de vida dos participantes, tanto adultos como idosos.
O Natal é, anualmente, um momento de celebrar a vida e a maneira como a partilhamos com os outros. No entanto, muitas vezes, estamos tão distraídos com as obrigações e preocupações que deixamos de vivenciar a essência desta época. O Advento, no entanto, pode nos lembrar de que, ao aceitarmos quem somos, ao pensarmos de maneira mais generosa nos outros e ao modificarmos a nossa atitude, algumas coisas podem se tornar mais fáceis e até mais agradáveis. Para isso, proponho quatro semanas temáticas de reflexão:
- 1ª Semana: O Abandono das Zangas - Aprender a viver com o que não gostamos, aceitando as nossas falhas e reconhecendo que somos humanos, tanto nós quanto os outros.
- 2ª Semana: A Entrega - Reconhecer que há coisas que não podemos mudar em nós ou nos outros. Aprender a valorizar o que temos de bom, tanto em nós como nos outros.
- 3ª Semana: Transcendência - Trabalhar a capacidade de aceitar o que acontece sem questionar. Entender que não podemos controlar tudo, mas que podemos transformar a nossa atitude e tirar o melhor de todas as situações, até das mais desafiadoras, e ajudar os outros a fazer o mesmo.
- 4ª Semana: O Nascimento - O nosso nascimento contínuo, tornando-nos pessoas melhores para nós e para os outros, num processo de aceitação e entrega.
Que estas reflexões possam ajudar a viver o Natal de uma forma mais plena e consciente.
(Trecho do artigo publicado na Revista Relações)
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